terça-feira, 1 de novembro de 2011

Um café

O café desce estalando a garganta
Não me recordo de quando me tornei tão descritivo
Quando fiquei tão discreto? Tão prescrito?
(In)concluo.

Dia frio é o meu favorito
Para só ver e sorver assovios de janelas
Cheio de detalhes entalhados vivos
Nas poucas lembranças de ser tão externo
E na doce lembrança de não ser tão nítido
Eu resfrio as juntas do dedo
E, em segredo, junto-me ao calor do frio.

Nos dias frios o olhar negro da xícara nos encara mais efusivo
De relance, mas um relançe contínuo
Realça e lança sobre nós o próprio vício.

Há pouco de mim nas paredes da constância
Estou totalmente, pelos quadros na parede, absorvido
Perdido
Absorto em só detalhar o entorno
E pelas molduras robustas perseguido.

Entorno sobre minha roupa elegante
Um gole quente e errante de vivência
Sinto queimar a pele
Sinto a pele ardente
Sinto, no limite extremo de minha vida, a clemência
Divinamente escondida
A carpe: superfície individual, a margem da doutrina, o fio do egoísmo...

O exterior, suplantando o interno nevralgico, me convida
Ao simples decorar das coisas, dos ornamentos
Ao arrepio frívolo do não-sentimento
Pois nenhuma reflexão é tão importante quanto flexionar o sujeito, o alheio, o joelho, o cotovelo...
E me convém, agora, escrever nesse espelho
Que se forma na superfície dura do mim
Do mingau
Do café
Do mundo.


Bebo o resto, peço a conta, pago e saio mudo.




André Vargas

5 comentários: